Bem perto de nós, reaprende-se a viver com o lobo
O lobo. Visto como ameaça à vida
humana, fonte de crendices, símbolo de tudo o que é sombrio,
ameaçador, desconhecido. Mas também origem do nosso melhor amigo, o
cão.
Desde há séculos que criadores de
gado em todo o mundo mantêm com o predador um conflito encarniçado,
organizando batidas, construindo fojos, por vezes até espalhando
venenos que acabam por matar muitos outros animais. Em décadas
recentes, o lobo foi desaparecendo, recuando para esconderijos cada
vez mais remotos, tendo hoje as suas alcateias, em Portugal, menos
de 300 exemplares.
Mas, com o despovoamento do
interior, mais terrenos regressam à posse dos animais silvestres e
melhores condições ganham estes para se multiplicarem. O lobo faz
notar mais a sua presença em paragens onde pouco se dava por ele.
Noutras terras, como Bragança e o Gerês, sempre se mostrou bem
activo, perto de gentes habituadas à vizinhança do predador.
Assim chegamos aos dias de hoje. Em
Idanha-a-Nova, de Janeiro de 2012 a Outubro de 2013, nem um ataque
de lobos foi participado ao ICNF, para obtenção da respectiva
compensação. Isto apesar do município contar com uma elevada
densidade de cabeças de gado no seu território. A norte, em terras
como Almeida ou o Sabugal, alguns ataques a rebanhos têm trazido os
lobos para os jornais, com muitas queixas de quem vê o seu
ganha-pão ameaçado.
Mas em tempos não muito distantes,
Idanha-a-Nova foi notícia pelas piores razões: em Novembro de 2003,
veneno escondido em cadáveres de ovelhas, talvez para eliminar cães
selvagens que causavam danos ao gado, levou a morte de 30 aves de
rapina. Um ano depois, um lobo, visita rara no concelho, sofreu
igual destino.
Espera-se que tais práticas não
regressem; sendo que diminuir o uso ilegal de venenos é outro dos
objectivos do Projecto LIFE MED-WOLF - Boas Práticas para a
Conservação do Lobo em Regiões Mediterrânicas. Uma iniciativa que
se encontra já em acção nos distritos da Guarda e de Castelo
Branco; um projecto inédito, englobando organizações portuguesas e
italianas de natureza agrícola e ambiental, entidades estatais e
centros de investigação. Em Portugal, este esforço conjunto
desenvolve-se sob a coordenação do Grupo Lobo.
O objectivo primário é proteger o
último dos grandes carnívoros de Portugal, diminuindo o conflito
entre a presença do lobo e as actividades humanas, em regiões
rurais onde os hábitos culturais de coexistência se têm vindo a
perder. Ao longo de quatro anos, serão realizadas actividades para
avaliar a situação actual do lobo na região e os conflitos que a
sua presença origina. Formando os técnicos envolvidos na
conservação desta espécie, de forma a melhorarem a avaliação dos
prejuízos causados por este predador no gado, estabelecendo
relações de confiança com os criadores de ovinos, caprinos e não
só.
A prevenção dos prejuízos, através
de vedações eléctricas, de bons cães de protecção e do maneio
correcto do gado, para reduzir o risco de ataques do lobo, são
também acções prioritárias a realizar durante o projecto. Estão em
desenvolvimento grupos de trabalho sobre o estudo do lobo e sobre
métodos de prevenção dos prejuízos, potenciando a troca de
experiências com iniciativas similares e com especialistas
nacionais e estrangeiros. Para sensibilizar as comunidades locais,
em particular os criadores de gado, já tiveram início campanhas de
informação e outras iniciativas para melhorar o conhecimento e
compreensão sobre este carnívoro.
A coexistência entre o Homem e o
lobo na região raiana pode ser mais harmoniosa e proveitosa; para
isso, o projecto vai apoiar os interessados locais na resolução dos
conflitos com um predador que tem um importante lugar na nossa
História, na nossa Cultura e também na preservação de um equilíbrio
ecológico, fundamental para muitas actividades económicas.
Das escolas às autoridades locais,
passando por todos os interessados num convívio mais pacífico com a
fauna silvestre com que partilhamos o território, todos podem e
devem participar, enriquecendo este projecto com sugestões, ideias,
ou críticas. O e-mail lifemedwolf@fc.ul.pt está desde já ao seu
inteiro dispor.
Texto
produzido no âmbito do Projecto LIFE Med-Wolf, co-financiado pela
Comissão Europeia, integrando o programa LIFE.